Conecte-se

#EQUADOR

Noboa promete mandato ‘sem revanchismos’ no Equador

GIRO LATINO

Novo presidente tomou posse em Quito na quinta-feira com discurso “sem substância”, segundo analistas. Combater a insegurança e pacificar a política são temas prioritários em mandato de 16 meses

25 de nov. de 236 min de leitura
25 de nov. de 236 min de leitura

O presidente mais jovem a ser eleito na história do Equador também será um daqueles com menos tempo para mostrar serviço. A partir da cerimônia de posse nesta última quinta-feira (23), Daniel Noboa, que faz 36 anos no próximo dia 30, terá apenas 16 meses de governo para tentar fazer alguma coisa. Inclusive pela pouca importância conferida a um mandatário-tampão, Noboa assumiu o poder em evento discreto, com poucos líderes internacionais presentes e a maior parte da América Latina já mais preocupada com outra posse, a de Javier Milei, eleito na Argentina no domingo.

LEIA A NEWSLETTER #209

Mas, se o governo será curto, nem por isso a missão se torna menos desafiadora. Descendente de uma família de magnatas da banana, sendo filho de um ex-político que tentou, sem sucesso, virar presidente em cinco oportunidades, ele agora recebe uma herança bem menos desejável: um país mergulhado em uma crise de segurança pública e marcado por disputas políticas que levaram à própria eleição extraordinária que Noboa venceu.

O presidente do Congresso do Equador, Henry Kronfle Kozhaya (PSC), ergue a mão de Daniel Noboa, recém-empossado com a faixa presidencial. Foto: Fernando Sandoval / Assembleia do Equador
O presidente do Congresso do Equador, Henry Kronfle Kozhaya (PSC), ergue a mão de Daniel Noboa, recém-empossado com a faixa presidencial. Foto: Fernando Sandoval / Assembleia do Equador

Tentando garantir governabilidade para esse período de transição, o governo Noboa já fez concessões aos seus ex-adversários de segundo turno antes mesmo da posse: na semana anterior, quando a Assembleia Nacional substituta (eleita junto com o presidente) tomou posse, a nova situação já havia anunciado um grande acordo nacional com representantes do Revolução Cidadã, o partido do ex-presidente Rafael Correa (2007-2017).

Mesmo sem conseguir eleger como presidenta a ex-deputada Luisa González, que perdeu a votação para Noboa por uma estreita margem de menos de quatro pontos percentuais – numa proporção de 51,8% contra 48,2% dos votos, o aparente “teto” do correísmo na corrida pelo Executivo desde as eleições perdidas por eles em 2021 –, a esquerda vinculada a Correa conseguiu se manter com a maior bancada legislativa, fazendo 52 dos 137 assentos do Congresso unicameral. 

O resultado, já se sabia de antemão, é que dificilmente Noboa conseguirá avançar qualquer pauta sem a anuência desses novos aliados de ocasião, que podem rapidamente se converter em opositores se o governo sair dos trilhos. Não à toa, o próprio presidente usou parte de seu breve discurso de posse para dizer que vai romper o “ciclo de revanches” políticas vividas no Equador, mesmo com sua família tendo sofrido “perseguições” de “diferentes governos” no passado.

Em diversas ocasiões durante a campanha, Noboa exaltou as qualidades de Correa como mandatário, disse que o considerava um “acadêmico” e comparou sua própria trajetória à do ex-presidente: “ganhamos nas mesmas províncias”, destacou após a vitória no primeiro turno, mas tomando distância das posições mais “extremistas” do líder político atualmente asilado na Bélgica.

Daniel Noboa assina primeiros decretos como presidente, nomeando as autoridades de seu governo. Foto: Eduardo Santillán / Presidência do Equador
Daniel Noboa assina primeiros decretos como presidente, nomeando as autoridades de seu governo. Foto: Eduardo Santillán / Presidência do Equador

Não é demais recapitular: a curta gestão de Daniel Noboa servirá apenas para cumprir o restante do período presidencial do agora ex-mandatário Guillermo Lasso (2021-2023), que deveria governar até maio de 2025, mas implodiu toda a política local no primeiro semestre ao usar o dispositivo da “morte cruzada”. Na época, colocado diante da perspectiva de sofrer um impeachment, Lasso se antecipou ao processo e usou de uma prerrogativa constitucional a partir da qual o presidente do Equador pode dissolver o Congresso, desde que pague o preço de entregar também o próprio cargo, com a convocação de eleições gerais extraordinárias em um prazo de seis meses. 

Nessa transição, os grandes perdedores foram, além da própria direita mais vinculada a Lasso, os indígenas representados pelo partido Pachakutik, que dois anos antes haviam feito a maior representação de sua história (27 congressistas) e agora voltaram ao baixo patamar habitual (apenas quatro eleitos). Já para os correístas e para o Partido Social Cristão (PSC), as duas siglas que mais trabalharam pelo impeachment de Lasso, o processo antecipado rendeu frutos: mesmo sem conquistar o governo – o PSC perdeu ainda no primeiro turno, com Jan Topic, que chegou a ser apontado como possível surpresa, mas ficou em quarto lugar –, as duas siglas serão fiadoras da aliança de Noboa que, sozinho, tem apenas 14 legisladores. O PSC, embora também tenha um número modesto de deputados, garantiu uma influência maior no equilíbrio de forças ao encabeçar a direção do Congresso, com Henry Kronfle escolhido para presidir a Casa.

Prometendo evitar revanches, mas já de olho em uma nova candidatura em 2025, o jovem mandatário também se vê construindo seu castelo de cartas sobre uma aliança baseada mais na oposição a Lasso do que em uma coesão interna, com a clareza da grande e principal urgência que se desenha nesse nem um ano e meio de gestão: reduzir os índices de homicídios e crimes urbanos vinculados ao narcotráfico. Para isso, afirmou em sua curta fala, seu plano prioritário é criar empregos com “reformas urgentes”.

Analistas consideraram o primeiro discurso do presidente mais focado em questões políticas do que nos temas substanciais para o país, por vezes inclusive parecendo justificar sua capacidade de governar mesmo sendo tão jovem. Mas, como deixou claro o quase septuagenário Lasso em seus anos de crise e impopularidade, ter muita ou pouca idade é um detalhe secundário para um país que só quer menos balaceras.

CAPA: Daniel Noboa, novo presidente do Equador, em sessão de posse na Assembleia Legislativa do país, na quinta-feira (23). Foto: Jonathan Miranda / Presidência do Equador

#EQUADOR
AMÉRICA LATINA
INTERNACIONAL
DANIEL NOBOA
POLÍTICA