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Agosto eleitoral: entenda as próximas 3 votações latino-americanas

GIRO LATINO

Eleitores de Argentina, Equador e Guatemala vão às urnas com diferentes crises à espreita: primárias no país hermano são marcadas por caos econômico, equatorianos votam sob fantasma da violência; e guatemaltecos tentam espantar escândalos eleitorais

29 de jul. de 237 min de leitura
29 de jul. de 237 min de leitura

Dedo (ou papel) na urna e gritaria: é mais ou menos por aí que a banda vai tocar no continente no mês de agosto, quando três países latino-americanos abrem votação para definir o futuro político em momentos bastante conturbados. 

O festival eleitoral já começou em algumas províncias na Argentina, mas a rigor, o dia em que o processo ganhará corpo para valer será em 13/8, quando a maioria dos eleitores comparecerá às tradicionais PASO nacionais (Primárias, Abertas, Simultâneas e Obrigatórias), modelo de votação prévio criado durante o primeiro mandato da ex-presidenta Cristina Kirchner (2007-2015) para “filtrar” candidaturas: além de tirar da corrida candidatos que obtiverem menos de 1,5% dos votos válidos, as primárias do país vizinho também separam o joio do trigo, selecionando as listas que vão representar cada partido ou coligação na votação oficial em 22/10. O calendário eleitoral argentino, porém, é um tanto complexo, com datas distintas para as disputas regionais em cada província – Córdoba e Tucumán, por exemplo, já elegeram governadores no mês passado. Se as eleições presidenciais exigirem um segundo turno, ele será em novembro. 

O cenário é diferente, porém, na Guatemala e no Equador, as outras duas nações com cargos eletivos em jogo no próximo mês. Do lado guatemalteco, o clima é de final de jogo: em 20/8, cidadãos voltarão às milhares de seções eleitorais pelo país, de Petén a Santa Rosa, da capital a Quetzaltenango, para definir quem será o próximo presidente. O mandato será de quatro anos, a partir de meados de janeiro de 2024. Dois nomes brigam por uma única vaga: de um lado, a empresária conservadora (e velha conhecida dos eleitores) Sandra Torres defende as cores da tradicional Unidade Nacional da Esperança (UNE) – partido que, apesar da popularidade e da vitória de sua presidenciável no primeiro turno, perdeu terreno no Congresso, indo de primeira a segunda força no Legislativo unicameral; de outro, quem tenta sorte é a ‘zebra’ Bernardo Arévalo, presidenciável à frente do jovem partido de centro-esquerda Semilla. Ao contrário da UNE, a sigla progressista viveu sua primavera eleitoral em junho, tornando-se a terceira maior representação no Congresso e dando vida à esperança de uma possível vitória de Arévalo. 

Falando assim, até parece que o voo foi tranquilo – mas esteve longe disso. Antes mesmo do primeiro turno em 25/6, o processo eleitoral guatemalteco já vivia cercado de desconfiança pela exclusão de quatro presidenciáveis, incluindo o empresário Carlos Pineda, que chegou a liderar pesquisas divulgadas à época. Toda essa crise anterior à abertura das urnas, explicada em detalhes pelo GIRO, levou a população, observadores e entidades internacionais a questionarem as decisões dos órgãos eleitorais. Além disso, o escândalo voltou a apontar os holofotes ao governo do presidente Alejandro Giammattei, líder cuja escalada autoritária em anos recentes foi marcada pelo aparelhamento do Ministério Público, usado pelo governante para perseguir adversários judicialmente – tendência que acabou sendo decisiva para anuviar o tabuleiro eleitoral em 2023.

Se o clima já era tenso antes da primeira votação, piorou depois dela: vários partidos (incluindo a UNE de Sandra Torres) denunciaram uma suposta fraude eleitoral em junho, os órgãos competentes barraram a divulgação oficial dos resultados – e só voltaram atrás dias depois. E como se um problema só não fosse suficiente, o Ministério Público (o mesmo acusado de agir aos sabores do governo) resolveu, de forma totalmente questionável, determinar a suspensão do Semilla de Bernardo Arévalo (entenda o caso aqui). Apesar do novo solavanco, a turbulência passou, as altas cortes rejeitaram a suspensão do partido de Arévalo e as campanhas seguiram seus caminhos. Resta ver, agora, se o turno derradeiro no final de agosto trará novas dores de cabeça. Mas é certo que vai ter emoção – já que a menos de um mês da decisão não há pesquisas eleitorais apontando qualquer tendência. 

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Se na Argentina a votação é prévia e na Guatemala já está em momentos finais, as eleições equatorianas, também com primeiro turno marcado para 20/8, sequer estavam no calendário original – que só tinha na agenda uma nova abertura de urnas em 2025. Tudo mudou, porém, quando o presidente Guillermo Lasso, acuado por ameaças de impeachment, resolveu invocar um artigo da Constituição – a chamada “morte cruzada” – que lhe permitiu dissolver o Congresso Nacional, apinhado de adversários obviamente favoráveis à sua destituição. Nunca ativada antes, a medida cobra um preço caro: até obriga uma nova votação para renovar as 137 cadeiras legislativas, mas também força o presidente a entregar o cargo em seis meses, para que uma nova votação também escolha seu substituto – no caso, para um mandato-tampão que se encerra daqui a dois anos, quando Lasso passaria a faixa originalmente. 

Uma coisa é certa: a inesperada crise eleitoral abrirá caminho para um novo presidente. Com Lasso fora da disputa (ele até pretendia concorrer de novo, mas desistiu), os olhos da opinião pública agora se voltam para as oito chapas que competem no final de agosto. Há velhos e novos rostos na lista: após deixar o movimento Pachakutik, principal legenda indígena do país e partido que ele representou nas eleições de 2021, Yaku Pérez volta à pista e aparece em terceiro lugar nas pesquisas, agora encabeçando a coalizão “Claro que se puede”, que aglutina grupos de esquerda (leia a entrevista dada por Pérez a um editor deste GIRO). Em segundo lugar nos sondeos recentes está Otto Sonnenholzner, que ocupou o cargo de vice-presidente entre 2018 e 2020, durante o governo de Lenín Moreno. Com intenções eleitorais, ele renunciou ao posto meses antes da votação que terminaria com a vitória de Guillermo Lasso. 

A estrela equatoriana até aqui é a única mulher candidata ao trono em Quito. Luisa González, parlamentar destituída pela morte cruzada em maio, caiu para cima: após deixar o Congresso, foi escolhida para representar o movimento de esquerda Revolução Cidadã, liderado a um oceano de distância pelo ex-presidente Rafael Correa (2007-2017), atualmente asilado político na Bélgica e na mira da justiça equatoriana. Conhecida por ter ocupado diversas posições durante os anos de Correa, González disse em uma entrevista recente que terá no líder político a figura de um de seus “principais assessores”. Jurista de formação, ela também promete levar adiante a agenda que marcou os anos do correísmo: o aceno a movimentos populares por meio de programas sociais, mas, ao mesmo tempo, uma visão conservadora no campo dos costumes – repetindo seu tutor, ela também se posicionou contra a legalização do aborto, por exemplo.  

A favorita, no entanto, sabe que o jogo não está ganho: ainda que muitos eleitores associem Correa a um período de bonança, abastecido pelo boom das commodities do início do século, a situação, agora, é outra. Com uma explosão de homicídios, o Equador viu 2022 se tornar o ano mais violento de sua história, muito em função do avanço veloz do crime organizado. E nada mudou no que vai do ano: como relatado na seção do país nesta edição, políticos seguem sendo mortos e os presídios são palcos de banhos de sangue em meio aos conflitos entre grupos criminosos. De acordo com levantamentos recentes, em nenhum outro país do continente, os cidadãos se sentem tão inseguros. E, dependendo do peso que esse tema tiver na opinião pública, nomes menos conhecidos podem levar vantagem e cavar uma vaga no segundo turno. 

CAPA: Troca de guarda presidencial em Quito, no Equador, em 13 de junho. Foto: Bolívar Parra / Presidência do Equador

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